terça-feira, 22 de junho de 2010

Vida de Ascensorista


– quinto andar, por favor.
– oi, doze.
– treze.
– vou pro sétimo.
– bom dia, décimo.
­– quinto andar.
– Sobe!!

Vrumm plac!

– quinto andar!

Tum! Vrum!

– dá licença, obrigada.

Vrumm plac!
...
Tum! Vrum!

– sétimo andar. Subindo!
– obrigado.

Vrumm plac!
...
Tum! Vrum!

– décimo segundo.
– o senhor não parou no dez, quer marcar, por favor.

Vrumm plac!
...
Tum! Vrum!

– décimo terceiro...Desce!!
– descendo?
– descendo.

Tum! Vrum!

– décimo andar.
– até que enfim.

Vrumm plac!
...
Tum! Vrum!

– térreo. Sobe!
– décimo primeiro, por gentileza.
– pois não, senhora.
– quarto, mas...como estava dizendo, ele acabou descobrindo tudo, minha filha, foi um escândalo...

Vrumm plac!
...
Tum! Vrum!

– quarto andar!
– e os dois continuam trabalhando aqui?
– continuam, você precisava ver...
– sobe!

Vrumm plac!
...
Tum! Vrum!

– décimo primeiro, senhora.
– obrigada.
– de nada.

Vrumm plac!

– fala negão, viu o jogo de ontem?
– terceiro, valeu?
– aquele jogo horroroso.
– nono andar.
– não achei, não! Pô, tu não viu o Pet, como jogou?
– oito, por favor.
– subindo!
– hei, moço, espera.

Vrumm plac!

– o onze, obrigada, viu.
– pô, ele fez um golaço.
– terceiro andar.

Tum! Vrum!
...
Vrumm plac!
Trim, trim

– que é?
– já viu a morena aí atrás de você, ô trouxa.
–Deixa eu trabalhar...Oitavo andar!
– valeu, negão.

Tum! Vrum!
– nono andar.
Vrumm plac!
...
Tum! Vrum!

– décimo primeiro andar.
– moço, é aqui que fica a loja de conserto de relógio, não é?
– é ali, moça. Segue em frente, é a porta de vidro a direita.
– obrigadinho.

Vrumm plac!
Trim, trim

– que é dessa vez.
– que é que ela queria?
– não enche rapaz. Desce!

Tum! Vrum!

– desce!

Vrumm plac!

– Pô, cara. Tenho que ir a quatro bancos, olha o monte de coisa pra pagar.
– e aí, seu Antônio, firme aí nas paradas?
– como sempre. Desce!

Vrumm plac!

Tum! Vrum!

– térreo. Sobe!
– o INCB, fica no oito, né?
– não, no nove.
– é pra lá que vou.
– treze...então cara, tu tem que fazer alguma coisa, vai deixar assim mole?
– por favor, o doze.

Vrumm plac!

– a única coisa que dá cana é não pagar pensão.

Tumm prac tum

– uau, o que foi isso? O elevador parou, ai meu Deus.
– ô José, o gerador entrou?

Prac tumm prac

– é assim mesmo, de vez em quando acontece, mas o gerador já entrou.
– nono andar.
– acho que vou descer aqui, também.

Vrumm plac

– décimo.

Vrumm plac

– décimo terceiro.
– valeu, chefe.
– descendo!
– obrigada, moço.
– de nada. Resolveu teu assunto na relojoaria?

Vrumm plac

– eles disseram, pra “mim” voltar na outra semana.

Tumm prac tum

– ai moço, o que tá acontecendo? Ai, moço, me acode. Por que parou?
– calma moça, espera, não precisa ficar apavorada, já vai resolver.
– ai, moço. Vou chorar, eu tenho medo de elevador parado. Me dá a mão, moço.
– calma moça, não vai cair não, moça...Espera aí... Não me agarra.

Trim, trim

– calma, deixa atender o interfone, espera.
– ai, ai, ai, ai. Meu Deus! Me tira daqui, moço.
– O que houve aí embaixo, agora?
– deu um breique aqui no disjuntor, você tá aproveitando, hein negão.
– vai à merda, porra!
– moço, o senhor tá me xingando?
– não, moça, tô xingando a besta lá de baixo.

Prac tumm prac

– pronto, moça, já estamos descendo.
– glória a Deus, bem que minha mãe falou pra eu ir à igreja de manhã.
– Chegamos. Vai com Deus minha filha.
– Vai subir, moço?
– Não! Enguiçou, esperando a manutenção, pega o elevador 2...Tu não é mole, vai acabar despedido, vai ver!
– Chega aí, Antonio. Que coisinha, hein? Botei na tua mão, hein. Quero ver tu fazer isso comigo.
– vai esperando, cara de pau. Isso não se faz. Não me aproveito de ninguém. Vou desligar aquela câmera, quando você tiver na portaria e tem mais, vou falar com o supervisor a teu respeito. Não tô aqui, pra brincar contigo, não. Moleque!

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Desvario Real

No devastado campo,
entre linhas e colunas,
sem mais as hereges eminências,
nem os valentes cavaleiros e peões,
nem mesmo castelos e Ladies MacBeths,
ainda vivos, os obstinados reis,
insanos como Lear,
permaneciam entreolhando-se.
A despeito dos seus alter egos,
agiam como robôs rebeldes.
O Branco Hamlet invadido
por fantasmas procurava ferir,
o rei usurpador.
O Negro Otelo acometido de violentos ciúmes,
fugia das assombrações do coração,
não sem antes entregar sua amada Dama à morte.
Rd5 - Re8
Re6 - Rf8
Qual deles sucumbirá a maior ira?
Posted by Picasa

Ciranda de Luz


Súbita interferência no negro,

riscos lumínicos tranversais

explodem no espaço vazio.

Os vértices de velozes fractais

ferem a quietude do nada negro;

o branco jorra em leitoso passeio

o véu sobre a ciranda de luz.


Uma assembleia vermelha

de corpúsculos abraçados,

saltiltam frenéticos, sobre o negro nada negro.

Fugazes vermelhos dançantes,

enevoados pelo branco véu.

Fugazes vermelhos dançantes, enevoados pelo branco...

Fugazes vermelhos dançantes...

Fugazes vermelhos...

Fugazes...

...